Dois de novembro é o dia de lembrar e homenagear as pessoas queridas que já se foram. Em Araçatuba (SP), os dois cemitérios municipais possuem 30 mil túmulos, mas há aqueles que são mais visitados, seja pela atribuição de milagres ao morto, pelo apelo popular que passa de geração para geração, ou mesmo pela curiosidade de rever ou conhecer parte da história de uma personalidade que por aqui viveu.
Neste Dia de Finados, são esperadas 40 mil pessoas nos dois cemitérios da cidade. Muitas delas não vão visitar apenas túmulos de conhecidos, amigos ou de familiares, mas irão prestar homenagens e demonstrar gratidão a desconhecidos que acabaram se tornando figuras queridas após a morte.
Janico
Francisco P. Souza, o Janico, era um gaúcho que veio para Araçatuba. Era andarilho, assim como sua mulher, Maria Puppo de Farias. Os dois catavam papéis e papelão pelas ruas da cidade, ao lado de sua cachorrinha, a “Fofoca”.
O casal vivia no centro de Araçatuba, entre as ruas Silva Jardim e Cussy de Almeida. O vereador Dr. Alceu (PSDB), pesquisador da memória de Araçatuba, conta que Janico andava com um saco nas costas.
Isto assustava as crianças, pois diziam ser o “Homem do Saco”, figura do imaginário popular que sequestrava crianças e as colocavam em um saco.
O apelido Janico era em razão de um personagem que o ator e humorista Canarinho (Aloísiio Ferreira Gomes) fazia na televisão. Eles eram muito parecidos.
Janico e a mulher moraram uma época em um barraco no centro da cidade, Uma vez, bêbado, ele colocou fogo no barraco. Muitas vezes, ele empurrava uma carrocinha para recolher papéis e papelão e, juntamente, com a sua companheira, andavam pelas ruas da cidade.
Era um casal muito engraçado e divertido, que gostava de beber, conta o vereador Dr. Alceu. No carnaval, saíam no bloco dos miseráveis com a famosa carrocinha e com a cadelinha dentro. Quando Janico ficava muito bêbado, Maria o colocava na carrocinha e o levava de volta para “casa”.
O corpo de Janico foi sepultado no Cemitério Recanto de Paz, no Jardim Rosele. Muitas pessoas até hoje visitam o seu túmulo para pedir milagres e deixam muitas placas de agradecimento por graças recebidas.
Menina Laila
A maior parte das sepulturas mais visitadas está no Cemitério da Saudade, o mais antigo da cidade. É o caso da menina Laila Ganme, falecida em 1935, antes de completar os cinco anos de idade e tida como milagreira.
Até hoje, ela recebe homenagens em flores, bilhetes, brinquedos, chupetas, doces, balas e adornos. Muitos levam pipoca, pois acreditam que ela tenha morrido engasgada com o alimento, mas, na verdade, foi acometida por uma pneumonia.
Monsenhor Victor Ribeiro Mazzei
Outro túmulo que recebe milhares de visitas, no Cemitério da Saudade, é o do Monsenhor Victor Ribeiro Mazzei, pároco da antiga Igreja Matriz de Araçatuba. Ele morreu em trágico acidente de carro, em 1960, quando se deslocava para o Santuário de Aparecida (SP).
Sua morte causou muita comoção na cidade, onde havia chegado em 1940 e ajudado em várias causas sociais, como a fundação do Albergue Noturno e da antiga Casa da Criança. Hoje, dá nome a uma escola municipal, localizada na Vila Mendonça.
A ele também são atribuídos muitos milagres e, na parede atrás de seu mausoléu, há centenas de placas de agradecimento por bênçãos variadas recebidas, seja a conquista de um emprego; a cura de uma doença; ou mesmo a vitória sobre um vício.
Dr. Jaime de Oliveira
O médico Jaime de Oliveira, paulistano que veio trabalhar em Araçatuba, é outra figura que, até hoje, recebe homenagens póstumas e agradecimentos por milagres que teria feito, sobretudo relacionados à cura de doenças.
Uma das placas, porém, é de uma mãe que agradece ao médico por ter tirado o seu filho do crime.
Dr. Jaime de Oliveira, que também era pecuarista, dá nome à praça ao lado da Santa Casa, onde trabalhava, no Centro.
Benedita Fernandes também é tida como milagreira
O túmulo de Benedita Fernandes, no Cemitério da Saudade, também está entre os mais visitados. A ela são atribuídos milagres e há vários agradecimentos por graças recebidas.
Também conhecida como “Dama da Caridade”, Benedita Fernandes foi uma benemérita que viveu em Araçatuba no início do século 20 e desenvolveu trabalhos sociais voltados a doentes mentais e a crianças carentes.
Nascida em 27 de junho de 1883 na cidade de Campos Novos de Cunha (SP), Benedita viveu em Penápolis (SP) antes de vir para Araçatuba e sofria de “obsessão”, segundo a comunidade espírita.
Esta condição, no entanto, era vista como problemas mentais e, como não havia locais apropriados para o tratamento destes transtornos, ela chegou a ser levada para a delegacia, em Penápolis, por incomodar moradores.
Naquela ocasião, ela teria recebido um chamado, que prometeu a ela a cura, desde que se dedicasse aos enfermos e pobres. A partir daí, ela iniciou a sua missão.
Era o ano de 1925, quando, juntamente com um grupo espírita, construiu casas de madeira para atender doentes mentais e crianças abandonadas. Sete anos depois, criou a Associação das Senhoras Cristãs e fundou a Casa da Criança e o Asilo “Dr. Jaime de Oliveira”, que recebia os dois públicos a que ela se dedicava.
Mais tarde, o asilo transformou-se no Hospital Psiquiátrico Benedita Fernandes, que hoje não tem mais a função de hospital, pois deixou de receber pacientes em 2015, devido ao corte de repasses do SUS (Sistema Único de Saúde), mas seu legado e reconhecimento de seu trabalho permanecem vivos, após 77 anos de sua morte, em 1947.