Cosméticos: quando a pesquisa química é aliada da saúde, do ambiente e da economia

Foto: Lubov Lisitsa/Pixabay
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Você sabe quantos cosméticos usa por dia? Se você respondeu menos que cinco, provavelmente vai perceber que se enganou quando terminar de ler este texto. É comum associar cosméticos apenas a maquiagem e estética, mas eles têm grande importância para a saúde e bem-estar.

Talvez você não saiba, mas o sabonete é um cosmético capaz de reduzir a mortalidade infantil ao prevenir doenças respiratórias e diarreias quando usado para lavar as mãos.

Quando estamos longe da pia, podemos substituí-lo por outro cosmético: o álcool em gel. Já o creme dental previne cáries e periodontite, e adivinha, também é um cosmético que você já deve ter usado hoje.

A higiene corporal completa, incluindo rosto e cabelos, é essencial para a saúde. E o desodorante, por exemplo, melhora o bem-estar até de quem está ao nosso redor.

Em climas secos, um hidratante pode evitar que rachaduras na pele ou lábios se agravem. Já em épocas de chuva, mosquitos aparecem e nos lembramos dos repelentes, que previnem doenças transmitidas por insetos, como dengue, Zika, Chikungunya, malária e febre amarela.

E quando nos expomos ao Sol, o protetor solar é indispensável para evitar queimaduras e câncer de pele.

Pois é, todos esses produtos são cosméticos.

Claro, os cosméticos também estão ligados à estética. Espuma de barbear, maquiagem, perfumes, esmaltes — todos são cosméticos que influenciam como nos apresentamos à sociedade, afetando nossa qualidade de vida, nossa autoestima e saúde mental.

Cosméticos não são remédios, mas estão profundamente conectados à saúde na forma de prevenção. Como já diz o ditado: prevenir é melhor que remediar.

Sustentabilidade

Mas e o ambiente? Com tanta gente no mundo usando cosméticos, para onde vai tudo isso? Para a natureza, claro! E não adianta se iludir com produtos “100% naturais”. Lavoisier, o pai da Química, já dizia: “Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Seu produto biodegradável não vai simplesmente desaparecer — ele vai se transformar em outra coisa. Mas em quê?

A demanda por cosméticos sustentáveis fez surgir o movimento “clean beauty”, que preza por produtos naturais supostamente mais saudáveis e sustentáveis. No entanto, esse movimento muitas vezes alimenta um medo irracional da química.

As pessoas esquecem que tudo, seja natural ou artificial, é composto de substâncias químicas. E é justamente a pesquisa química que tem ajudado a tornar os cosméticos mais sustentáveis.

Muitas empresas de cosméticos já investem em embalagens recicláveis e biodegradáveis, em ingredientes de fontes renováveis ou de menor impacto ambiental. E tudo isso é graças à pesquisa em química, que também tem possibilitado processos de produção mais eficientes, com menos resíduos e menor consumo de energia.

Em meu grupo de pesquisa, por exemplo, temos diversos estudos neste sentido. Temos pesquisado a interação entre ingredientes que são alternativas mais sustentáveis para potencializar seu uso em diferentes formulações. Também estamos desenvolvendo produtos waterless, ou seja, que levam menor quantidade de água. Isso reduz o uso de embalagens plásticas e torna seu transporte mais eficiente, reduzindo a queima de combustíveis fósseis.

Enquanto a química for vista como vilã, porém, estaremos lutando contra quem pode ser nosso maior aliado. No nosso grupo de pesquisa, trabalhamos com divulgação científica por meio do Instagram @macro.nano.lab. Lá ajudamos as pessoas a identificar o que realmente é científico, sustentável e saudável, para que não caiam na desinformação ou no medo da química. Assim, evitamos que sejam enganadas por falsos apelos de clean beauty e um consumismo desenfreado.

Acreditamos que a ciência é a chave para tornar o consumo mais consciente e informar corretamente os consumidores sobre os produtos que usam diariamente. Desperdício e desinformação não beneficiam ninguém, nem a saúde, nem o meio ambiente.

E por falar em consumo…

Você sabia que o Brasil é o 3º maior mercado consumidor de cosméticos no mundo?

Em 2023, a venda de produtos de higiene e beleza totalizou R$ 156 bilhões, com superávit na balança comercial de US$ 80,8 milhões, gerando mais de 150 mil empregos diretos e de 6 milhões de oportunidades de trabalho. Foi este grande mercado que estimulou o surgimento desde pequenas empresas a grandes marcas reconhecidas internacionalmente, como Natura, Granado e Boticário.

Multinacionais como L’Oréal e Pierre Fabre também trouxeram centros de pesquisa para o Brasil para desenvolver produtos para atender o perfil do consumidor brasileiro.

Ao gerar empregos e oportunidades para pesquisadores brasileiros, temos um estímulo à nossa ciência. Devemos nos orgulhar de ver químicos, farmacêuticos, engenheiros e outros profissionais brasileiros que usam a ciência no desenvolvimento de produtos direcionados ao público nacional.

E podemos cobrar para que ofereçam soluções para promover a saúde com menor impacto ambiental. Mas, para tudo isso, eles devem usar a química! Portanto, para cobrar soluções realmente eficazes da indústria, é preciso compreender que a química é nossa maior aliada — e não a vilã que algumas propagandas sugerem.

Ana Percebom, Professora e pesquisadora, Departamento de Química, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)

This article is republished from The Conversation under a Creative Commons license. Read the original article.

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