Símbolo da cultura araçatubense, o icônico Teatro São João será reaberto nesta sexta-feira, 17 de janeiro, com uma apresentação exclusiva aos que apoiaram a iniciativa de dois palhaços que decidiram arregaçar as mangas e reformar todo o espaço, que estava desativado desde o início dos anos 2000.

Após quatro meses de obra, o teatro, que já havia sido transformado em igreja evangélica e em depósito de pneus, volta a receber espetáculos e artistas, e o principal: o público. O espetáculo que marca a reabertura é “O Poderoso Palhaço”, da Companhia Ali Teatro, de Presidente Prudente (SP).

A montagem, no entanto, será apenas para os apoiadores da reforma do teatro. O grande público terá a sua vez de revisitar o espaço de arte no domingo, 19, quando será a vez da Companhia Pé de Ciranda, de Penápolis (SP), subir ao palco com “Era uma Vez”, às 17h. Os ingressos estão à venda por R$ 15,00 e mais informações podem ser obtidas pelo instagram @casadoteatro_oficial.

A ideia de reformar e reabrir o São João partiu dos palhaços Charles Ferlete e Vinícus Forato, da Companhia Pano de Chão, que possuem uma escola de artes e treinamento empresarial, a Casa do Teatro. Eles ficavam tristes quando passavam em frente ao teatro e viam o espaço fechado.

“O primeiro palco que eu pisei foi o do São João, com uma peça chamada “Praça de Retalhos”, contou o palhaço Charles Ferlete. Na época, os grêmios estudantis promoviam festivais de teatro no espaço e foi em um destes eventos que ele pôde conhecer o espaço.

Como o prédio onde a escola dos palhaços funcionava havia ficado pequeno para as atividades que desenvolvem, eles se encorajaram, locaram o prédio do Teatro São João, que fica na rua Luís Nogueira Martins, bairro de mesmo nome, e deram início à saga da reforma.

Venderam carro, moto, fizeram empréstimo, organizaram dezenas de apresentações artísticas para angariar recursos e megulharam no projeto para a reabertura. Eles avaliam que tenham gasto, pelo menos, R$ 150 mil com a grande reforma, sem contar as poltronas, que foram um ato cênico à parte.

Para adquirir os 300 assentos para o teatro, Ferlete e Forato lançaram uma campanha de apadrinhamento de poltronas. O “padrinho” doava R$ 450,00 e tinha o seu nome escrito nas cadeiras. A ação arrecadou perto de R$ 140 mil e possibilitou a aquisição dos lugares.

Já as obras do prédio incluíram a troca do telhado e do piso, reforma do banheiro e da parte elétrica, estrutura de luz cênica, som, instalação de três aparelhos de ar-condicionado. O palco, que estava todo danificado, precisou ser refeito.

A árdua rotina da reforma foi registrada em uma espécie de “diário”, publicado no instagram @teatrosaojoao

Letreiro

Ferlete conta que Márcio Colaferro, responsável pelo design do prédio quando o São João foi transformado em teatro, em 1987, entregou o projeto original e, na medida do possível, tudo foi feito preservando a sua identidade.

Até o letreiro, desenhado à mão por Colaferro, foi redesenhado de acordo com o orginal, mantendo o logo e a história daquela casa artística, que foi transformada em teatro nos anos 1980. Antes, o prédio abrigava o Cine São João, dos irmãos Cury.

Não há registros de quando o espaço foi construído, mas possivelmente tenha sido erguido na década de 1950. Há imagens e relatos da grande reforma pela qual passou, em 1970, para a reabertura do cinema.

O ex-secretário municipal de Cultura de Araçatuba Hélio Consolaro conta que assistiu a muitos filmes no local, entre as décadas de 1960 e 1970.

Cinema Desapropriado

Em 1987, o então Cine São João foi desapropriado pela Prefeitura, na gestão do prefeito Valter Tinti, e transformado no Teatro Municipal Floriano Camargo Arruda Brasil.

O espaço fez parte da efervescência cultural de Araçatuba dos anos 1980 e 1990. Na parte superior do prédio, havia aulas de balé e de italiano, estas últimas ministradas pelo padre Ângelo Rudello (in memoriam).

Muitos espetáculos de circulação nacional passaram pelo palco do teatro. Mas, já no final da década de 1990, na gestão da prefeita Germínia Venturolli, Araçatuba ganhou destaque na mídia após a atriz Zezé Polessa mostrar a sua indignação ao ter que dividir o palco do São João com baratas, devido à falta de dedetização no local.

Em 2001, ao assumir a Prefeitura e constatar o atraso no pagamento dos precatórios gerados pela desapropriação, Jorge Maluly Netto (in memoriam) decidiu entregar o teatro, que a partir daí perdeu sua função artística e passou a ter uso religioso e, depois, utilizado como depósito.

Novos tempos

Na tarde desta sexta-feira, os palhaços Charles Ferlete e Vinícius Forato faziam os últimos ajustes para reabrir as portas do querido São João.

A ideia é fazer e trazer muitas apresentações ao palco do teatro. “Quanto mais gente consumindo teatro, melhor”, disse Ferlete. O espaço também poderá ser sublocado para shows, formaturas e outros eventos.

Outra proposta futura é transformar o teatro em um cinema, para promover circuitos alternativos e resgatar a memória afetiva de quem frequentou o espaço na época em que ele ainda abrigava o Cine São João. Para isso, será preciso providenciar uma tela e adquirir um projetor.