Nexus

Adelmo Pinho escreve sobre o novo livro de Yuval Noah Harari, da editora Companhia Das Letras.
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Nexus, o novo livro de Yuval Noah Harari, da editora Companhia Das Letras, relata a história das redes de informação, da Idade da Pedra à inteligência artificial. Harari é autor de outras obras renomadas, como Sapiens e Homo Deus. A obra recente é muito interessante. Ela relata a origem da informação e o seu compartilhamento desde o surgimento da humanidade, dando atenção especial à Bíblia, a invenção dos meios de comunicação e o ressurgimento do populismo no mundo.

A obra aponta que diferentes tipos de sociedade, como o Império Romano e religiões, usaram de informações para atingir seus objetivos, para o bem e para o mal. Questiona o historiador: “Se nós, humanos, somos inteligentes, por que somos autodestrutivos”? “Por que somos tão bons em acumular mais informação e poder, mas muito menos hábeis em adquirir sabedoria”? A obra aborda sobre o rompimento do equilíbrio climático no planeta, e pondera que informação nem sempre corresponde à verdade.

Certamente, informação não é sinônimo de verdade ou mesmo de sabedoria. No tópico sobre racismo, Harari afirma que a solução é fornecer às pessoas mais fatos biológicos e históricos, como meio de conscientização. Ponto central da obra é a IA – Inteligência Artificial, outra preocupação mundial.

Seria simples, se a IA fosse usada somente para o bem comum. O manejo da IA levou em 2023 líderes de potências mundiais (EUA, China, Reino Unido etc.) a assinarem a Declaração de Bletchley sobre IA reconhecendo o risco de extinção da humanidade se não houver controle.

A obra, aborda, também, sobre o perigo do populismo de novos líderes políticos e religiosos. De fato, há sempre o risco de líderes populistas que, a partir de estórias repetidas, ideologias e dogmas, para atingirem seus objetivos, tornarem uma mentira em verdade objetiva (tal como se deu no nazismo, que matou milhões de pessoas e “afundou” a Alemanha).

Assim, o risco é o de que, a partir de narrativas, cada um criará a sua “verdade”. Relata a obra, que para o marxismo, no Manifesto Comunista de 1848, a ideologia de Marx se resumia numa luta de classes do “senhor e do servo”.

Lembro que essa ideologia foi aos poucos sendo contestada, até mesmo por pensadores de esquerda, como Michel Foucault, para quem todas as pessoas possuem uma parcela do poder; logo, não se restringe a uma “luta classista”.

E mais: com o surgimento da internet e das redes sociais tornou-se verdade que o cidadão contemporâneo comum tem poder, como nunca teve antes, e a teoria de Marx foi “caindo por terra”, confirmando-se a teorização de Foucault de
uma “divisão de poderes”.

O filósofo e cientista político Fernando Schuler indicou como novo ator do cenário político o homem comum, não por acaso. A obra também aponta a Igreja Católica como a instituição mais promissora na difusão de suas crenças (informação), dando como exemplo a história de Jesus Cristo; a conexão de bilhões de pessoas seguidoras do cristianismo é a prova disso.

A burocracia mundial é outro assunto abordado. Harari menciona, sobre isso, o livro O Processo, de Franz Kafka, obra, diga-se de passagem, intrigante sob vários aspectos, não só quanto à burocracia. Ele denomina a burocracia de “governo de escrivaninha”.

Para Harari, “a história não é o estudo do passado; é o estudo da mudança”,
fazendo-nos lembrar da teoria da modernidade líquida de Zygmunt Bauman (conceito sociológico que descreve que a era atual é marcada por questões culturais, sociais e econômicas instáveis e voláteis).

Temos que ter em mente, assim, que nem toda informação é verdadeira. Na política, em especial, presenciamos uma avalanche de Fakes News. Nas religiões, nas guerras, no mercado financeiro, nem sempre informação significa
verdade ou fato.

O ser humano é um eterno fingidor … O historiador enfatiza, também, que o homem não consegue viver sem “estórias”, porque elas lançaram as bases para toda a cooperação humana e fizeram de nós animais diferenciados. Ele dá como exemplo disso, O Ramayana, um dos contos fundantes da mitologia hindu, que tem 24 mil versos, mas apesar de sua extensão, gerações de hindus conseguiam lembrá-los e recitá-los de cor.

Ou seja, nossas mentes gravam estórias com facilidade. Enfim, o livro em questão trouxe questionamentos importantes e temas polêmicos para reflexão. Uma mensagem importante se extrai dessa obra: quanto mais informação, melhor para chegarmos à conclusão sobre a “verdade” de algo e escaparmos das narrativas!

Outra verdade: a inteligência artificial, tal como a ciência, se usada para o bem comum, só trará benefícios à humanidade! Comparo-a a uma faca: pode ser usada para o bem (uso para facilitar a alimentação) ou para o mal (tirar a vida de
alguém).

O segredo, assim, é a finalidade do uso, tanto de uma simples faca, como da complexa Inteligência Artificial. Enfim, por tudo isso, Nexus é uma obra que merece leitura e reflexão.

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